Não há dano moral quando paciente não segue orientações médicas

Direito Civil - Responsabilidade Civil - A família ingressou com a ação contra a entidade médica requerendo a reparação dos danos materiais e morais gerados pelo nascimento do co-autor, um ano após a realização de vasectomia no pai. O pedido foi negado em primeira e segunda instância.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos.

Acordam os Magistrados integrantes da Décima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em, afastada a preliminar, negar provimento ao apelo.

Custas na forma da lei.

Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN (PRESIDENTE) E DRA. ANA LÚCIA CARVALHO PINTO VIEIRA.

Porto Alegre, 06 de outubro de 2005.

DES. LUIZ ARY VESSINI DE LIMA,
Relator.


RELATÓRIO
DES. LUIZ ARY VESSINI DE LIMA (RELATOR)

FULANO, BELTRANA e SICRANO ajuizaram ação ordinária contra ENTIDADE DE SAÚDE S.A., pedindo a condenação da ré à reparação dos danos materiais e morais gerados pelo nascimento do co-autor SICRANO, um ano após a realização de vasectomia no patriarca. Alegaram falha na prestação do serviço pela ré.

A sentença de fls. 119/122 julgou improcedente a ação, condenando os autores ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 700,00 (setecentos reais). Suspenso o pagamento em razão da concessão da gratuidade da justiça.

Apelam os autores em fls. 124/127 dizendo que a sentença deve ser reformada. Preliminarmente, alegam a nulidade da sentença, por ferir o princípio do devido processo legal, uma vez que o juízo “a quo” entendeu tratar-se de caso ensejador do julgamento antecipado da lide, calando-se a respeito dos pedidos de provas das partes. Salienta que o Ministério Público opinou pelo deferimento da produção probatória. No mérito, aduzem que a responsabilidade das clínicas é objetiva, nos termos do art. 14 do CDC, sendo que o risco de insucesso do procedimento cirúrgico, qual seja, esterilizar o autor, é inerente à sua própria atividade. Relatam que sofrem danos morais decorrentes de comentários jocosos, principalmente em relação à fidelidade da esposa. Sustentam que os danos patrimoniais se referem aos custos do sustento do menor, nascido de forma inesperada, até que este atinja a maioridade. Por fim, pedem o provimento do recurso.

Em contra razões, às folhas 130/146, a ré refutou as articulações esposadas no recurso adverso, pugnando pelo seu não provimento.

Subiram os autos.

O processo foi submetido à revisão.

É o relatório.


VOTOS
DES. LUIZ ARY VESSINI DE LIMA (RELATOR)

Eminentes Colegas! Entendo que a r. decisão de primeiro grau deva ser mantida.

De início, examino a preliminar de cerceamento de defesa, para afastá-la.

É que, tem-se entendido, o julgador de primeiro grau é o real destinatário das provas a serem produzidas pelas partes, cabendo-lhe, portanto, em um primeiro momento, a prerrogativa de deferi-las ou indeferi-las, consoante a relevância que revelarem para a formação de seu livre convencimento.

Certo também que tal faculdade não é absoluta e vem regulada em lei. Há casos em que a dispensa pode cercear o direito de defesa do litigante.

Não parece ser este o caso dos autos.

Aqui, sem que se adentre no mérito da causa, em princípio, já há elementos probatórios suficientes para o esclarecimento dos fatos controvertidos, o que torna desnecessária a produção de outras provas.

Por outro lado, a realização da prova pretendida, neste momento, constituiria ônus desnecessário às partes, mormente diante da possibilidade da improcedência da demanda.

Quanto ao mérito, trata-se de ação de indenização por danos morais decorrentes de suposta prestação defeituosa dos serviços prestados pela demandada. Alegou o autor que após submeter-se a um procedimento cirúrgico de vasectomia por orientação da demandada, sua esposa engravidou novamente, o que não deveria acontecer.

Não prospera.

O julgador singular, em percuciente análise das questões controvertidas, esgotou a matéria, exarando sentença de improcedência. Dada a pertinência, adotam-se tais fundamentos, integrando-os a este julgado como razões de decidir, evitando-se indesejável tautologia. Disse sua Excelência:

(...)
“Cuida-se de ação de reparação de danos mediante a alegação de “DEFEITO NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO”.
Não há como se falar em defeito na prestação de serviços e, portanto, inexiste o dever de reparar os danos alegados (artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor).
A possibilidade de falhas é inerente ao procedimento em razão da possibilidade de re-canalizações espontâneas.
Trata-se de possibilidade admitida pela doutrina médica (fls. 12, 85 e 95) e não significa que houve erro no procedimento.
O autor estava ciente da possibilidade de falha do método, necessidade de controles por meio de espermogramas e imprescindibilidade da utilização de outro método anticoncepcional, pois firmou declaração contendo estas informações de forma detalhada (fl. 100).
No entanto, o autor não seguiu as orientações dadas pela ré.
Admite que realizou apenas um espermograma em 05 de novembro de 2001 (item 5 da fl. 03) e que não utilizou outro método anticoncepcional...
...A hipótese é de ausência de prestação defeituosa dos serviços e de responsabilidade exclusiva do primeiro requerente, sendo improcedente a ação...”

Assim, o principal fundamento da pretensão, má prestação de serviço, destarte, resta afastado.

Não se pode esquecer que para que haja a responsabilidade civil, e o conseqüente dever de indenizar, é necessária a existência de um dano, e que este dano seja oriundo de uma ação ou (omissão) praticada pelo agente, além de um liame subjetivo ou nexo de causalidade a ligar estes dois elementos, aqui não configurados.

Nesse sentido, os seguintes precedentes:

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS PATRIMONIAL E MORAL. PROVA. CUMPRE AO AUTOR A DEMONSTRAÇÃO DOS FATOS OBJETO DA PRETENSÃO INDENIZATÓRIA. SEM A PROVA DO ALEGADO ATO ILÍCITO IMPUTADO AO DEMANDADO, NÃO HÁ COMO EXTRAIR DE SUA CONDUTA REFLEXOS DE ORDEM PATRIMONIAL OU MORAL. (APC Nº 599247384, NONA CÂMARA CIVEL, TJRS, RELATOR: DES. MARIA ISABEL BROGGINI, JULGADO EM 28/06/2000).

RESPONSABILIDADE CIVIL. DANOS. INEXISTENCIA DE COMPROVAÇÃO. DANO HIPOTÉTICO.
REPARAÇÃO. INADMISSIBILIDADE. NAO PODE HAVER INDENIZAÇÃO ANTE A INEXISTÊNCIA DOS ELEMENTOS QUE CONFIGURAM A RESPONSABILIDADE CIVIL. NAO PROVADO O DANO DESCABE O PEDIDO DE INDENIZAÇÃO. APELAÇÃO DESPROVIDA. (APC Nº 197280365, SEXTA CAMARA CIVEL, TJRS, RELATOR: DES. JOAO PEDRO FREIRE, JULGADO EM 15/12/1999).

“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. DÉBITOS EM CONTA CORRENTE. RESTANDO INCOMPROVADA AO MENOS SUFICIENTEMENTE A EFETIVAÇÃO DO DANO MORAL, RESTA A IMPROCEDÊNCIA DO PEDIDO. [...] APELO DE JOSÉ IMPROVIDO E PARCIALMENTE PROVIDO O DO BANCO.” (APC Nº 70000354852, DECIMA NONA CÂMARA CÍVEL, TJRS, RELATOR: DES. GUINTHER SPODE, JULGADO EM 18/05/2000.).

Assim, não demonstrado o agir indevido ou ilícito da demandada, não há que se falar em obrigação de indenizar, nos moldes pretendidos na inicial.

Pelo exposto, afastada a preliminar, estou em NEGAR PROVIMENTO ao apelo.

É o voto.

DRA. ANA LÚCIA CARVALHO PINTO VIEIRA (REVISORA) - De acordo.
DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN (PRESIDENTE) - De acordo.

DES. PAULO ANTÔNIO KRETZMANN - Presidente - Apelação Cível nº 70012325650, Comarca de Porto Alegre: "AFASTADA A PRELIMINAR, NEGARAM PROVIMENTO AO APELO. UNÂNIME."


Julgador(a) de 1º Grau: SANDRO SILVA SANCHOTENE

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