Banco condenado em danos morais de devolução indevida de cheque

Direito Civil - Direto do Consumidor - O banco foi condenado por negativar o nome da correntista junto ao cadastro de emitentes de cheques sem fundo após devolver cheque quando havia na conta limite suficiente.

Vistos etc.

Nos Juizados Especiais Cíveis, o processo orientar- se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade (art. 2º, da Lei nº 9.099, de 26.09.1995), razão pela qual foi o relatório dispensado (parte final do art. 38, da mesma Lei).

Passo, de imediato, à fundamentação.

Cuida-se de AÇÃO COM VALOR INFERIOR A 40 SALÁRIOS-MÍNIMOS, cognominada de 'Ação de Indenização por Danos Morais com Pedido de Tutela Antecipada', onde ... alega que no mês de março de 2004, teria sido surpreendida pela notícia de inscrição de seu nome no cadastro de emitentes de cheques sem fundos, visto que, muito embora dispusesse de saldo suficiente na conta corrente nº ..., mantida na agência nº ..., do BANCO DO BRASIL S/A., em 18.03.2004, o réu teria devolvido sem o devido adimplemento, o cheque nº ..., no valor de R$ 33,90 (trinta e três reais e noventa centavos), ignorando o limite de crédito rotativo de R$ 200,00 (duzentos reais), motivo pelo qual, referindo estar sendo abalada pela obstrução de seu crédito, restando maculada sua imagem e honra, bradou pela antecipação dos efeitos da tutela invocada, com a baixa da inscrição de seu nome do referido registro de negativação, com a condenação do réu ao pagamento de indenização por aludido dano moral que sustenta ter sido vítima, no importe equivalente a 1.000 (hum mil) salários mínimos, ou, alternativamente, 100 (cem) vezes o valor do título objeto, conferindo ao Juízo a faculdade para a cominação de valor outro (fls. 02/08).

Após concedida a benesse da antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional invocada (fls. 21/22), o BANCO DO BRASIL S/A., apresentou contestação escrita, avultando que a culpa pelo não pagamento do cheque no singelo valor de R$ 33,90 (trinta e três reais e noventa centavos), seria da própria autora, que, apesar de cientificada, teria deixado de proceder a [...] "renovação do limite de crédito, antes da operação do desconto/compensação do cheque emitido" (fl. 31), motivo pelo qual, refutando a prática de qualquer ilícito contratual, pugnou pelo inacolhimento do pleito contido na inicial, bradando, alternativamente, pelo reconhecimento da culpa concorrente, com o respectivo equacionamento do 'quantum' indenizatório (fls. 30/34).

Não havendo preliminares argüidas, analiso, de imediato, a 'quaestio de meritis'.

A controvérsia nos presentes autos reside na atribuição (ou não) de culpa ao banco réu, pela indevida recusa ao pagamento do valor objeto do cheque nº ..., emitido em 01.03.2004, para saque contra a conta corrente nº ..., mantida na agência nº ..., do BANCO DO BRASIL S/A., cabendo esclarecer a circunstância de existência de um limite de crédito rotativo no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), com o que exsurgirá (ou não) o dever indenizatório conclamado pela postulante.

Passo, assim, à análise da prova produzida em audiência, imprescindível ao esclarecimento da controvérsia.

Em seu depoimento, ..., preposto do BANCO DO BRASIL S/A., reconheceu expressamente que "no dia em que o cheque da autora foi devolvido, havia disponível na sua conta o limite de R$ 200,00 (duzentos reais) relativo ao contrato de cheque Especial Classic" (fl. 62).

Este fato – reconhecido pelo próprio preposto do demandado – encontra-se lastreado na prova documental encartada à fl. 16, que indica a efetiva disponibilidade de limite de crédito automático, no valor de R$ 200,00 (duzentos reais), com vencimento da respectiva taxa em 31.03.2005.

Concluo, assim, que o BANCO DO BRASIL S/A não agiu com a necessária proficiência ao devolver a cártula apresentada para pagamento com fundamento no motivo elencado nos arts. 6º e 14, da Resolução nº 1.682, do BANCO CENTRAL DO BRASIL, vulgarmente denominada 'alínea 11', porquanto através de instrumento contratual oportunamente firmado, comprometeu-se a conceder a ... um crédito rotativo suficiente, na ocasião, à regular compensação da aludida ordem de pagamento.

Acerca da aplicação da legislação consumeirista ao caso sob julgamento, importante elucidar que, segundo o disposto no art. 2º, da Lei nº 8.078/90, 'consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final.'

Já o art. 3º, de tal legislação, conceitua que 'fornecedor é toda a pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestações de serviços.', sendo que '§ 1º - Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2º - Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remu- neração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.'

Em sua obra Contratos no Código de Defesa do Consumidor, CLÁUDIA LIMA MARQUES, ensina que "apesar das posições contrárias iniciais, e com apoio na doutrina, as operações bancárias no mercado, como um todo, foram consideradas pela jurisprudência brasileira como submetidas às normas e ao novo espírito do Código de Defesa do Consumidor de boa-fé obrigatória e equilíbrio contratual" (Op. cit. 2. ed. RT, 1995. p. 143).

À respeito, o SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA tem reiteradamente decidido que "o recorrente, como instituição bancária, está submetido as disposições do Código de Defesa do Consumidor, não porque seja fornecedor de um produto, mas porque presta um serviço consumido pelo cliente, que é o consumidor final desses serviços, e seus direitos devem ser igualmente protegidos como o de qualquer outro, especialmente porque nas relações bancárias há difusa utilização de contratos de massa e onde, com mais evidência, surge a desigualdade de forças e a vulnerabilidade do usuário." (Resp nº 57974-0-RS. Rel. Min. Ruy Rosado de Aguiar, 4a Turma).

Os magnânimos NELSON NERY JÚNIOR e ROSA MARIA ANDRADE NERY, ensinam que "Contratos bancários. Todas as operações e contratos bancários se encontram sob o regime jurídico do Código de Defesa do Consumidor. Não só os serviços bancários, expressamente previstos no Código de Defesa do Consumidor, art. 3º, § 2º, mas qualquer outra atividade, dado que o banco é sociedade anônima, reconhecida sua atividade como sendo de comércio, por expressa determinação do Código Comercial, art. 119. Assim, as atividades bancárias são de comércio, e o comerciante é fornecedor conforme prevê o caput do art. 3º, do Código de Defesa do Consumidor. Por ser comerciante, o banco é, sempre, fornecedor de produtos e serviços. O que pode ser discutido, eventualmente, é se determinado contrato bancário é ou não de consumo, ou seja, se o co-contratante é ou não consumidor. Esta é a discussão possível e jurídica acerca dos contratos bancários. A preocupação atual dos países ocidentais é dotar as leis de melhor proteção contra as atividades bancárias e creditícias. Acolhendo sugestão do Prof. Dr. Newton De Lucca, no Congresso Internacional de Direito do Consumidor (Brasília, Abril de 1994), o plenário aprovou conclusão unânime no sentido de que "os bancos e as atividades bancárias se encontram sob o regime jurídico do Código de Defesa do Consumidor". ('in' Código de processo civil comen- tado. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997. p. 1372. nota 12).

Não bastassem tais argumentos, a defesa do consumidor é garantida pela própria CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988, que a elevou à categoria de princípio geral da atividade econômica – art. 170, inc. V – e garantia individual – art. 5° inc. XXXII.

Da jurisprudência do TRIBUNAL DE JUSTIÇA de Santa Catarina, colhe-se que "a atividade desenvolvida pelas insti- tuições bancárias encontra plena tipificação na expressão fornecedor descrita pelo 'caput' do artigo 3º, uma vez que prestam serviços de natureza bancária, financeira e de crédito. A referência aos serviços bancários, financeiros e de crédito absorve a atividade de fornecimento de crédito" (AI nº 99.004349-5, de Xanxerê, relator: Desembargador CARLOS PRUDÊNCIO, publicado no DJE de 18.08.99).

De ser aplicada, assim, a disposição contida no art. 14, do CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR, segundo o qual 'o fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.'

O SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA, em recente acórdão de lavra da Min. NANCY ANDRIGHI, decidiu que "tratando-se de relação de consumo, a responsabilidade do fornecedor perante o consumidor é objetiva, sendo prescindível a discussão quanto à existência de culpa" (SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA - Terceira Turma, AGA nº 268585/RJ, publicado no DJU de 05.02.2001, Agra- vante: BANCO REAL S/A, Agravado: ARMANDINA VIEIRA DE SOUZA).

Assim, incontestável que "as instituições bancárias possuem responsabilidade objetiva pelo mau funcionamento de seus serviços, com relação a seus clientes, cabendo a elas, para isentarem-se da obrigação de reparar os danos causados em razão de préstimos imperfeitos, demonstrar ter a falha sobrevindo por culpa exclusiva do correntista ou de terceiros, ou, ainda, a inocorrência de qualquer defeito, nos exatos termos do §3º do mesmo art. 14." (Apelação Cível nº 01.002530-8, da Comarca de Concórdia. Apelante RUI GELSON SEGANFREDO, e Apelado BANCO MERIDIONAL DO BRASIL S/A. Presidente e Relator: Des. CARLOS PRUDÊNCIO. Julgado em 10 de abril de 2001).

Portanto, a análise da circunstância fático-jurídica exposta, aliada de forma indissolúvel à responsabilidade objetiva dos estabelecimentos bancários, prescreve, como medida de justiça, o acolhimento do pleito contido na inicial, visto que o banco réu, mesmo obrigando-se à concessão de suficiente limite de crédito rotativo, recusou o pagamento à cártula emitida pela autora, sob a alegação de insuficiência de recursos financeiros disponibilizados, procedendo à inclusão do nome de SIRLEI DA SILVA MATEUS no cadastro de emitentes de cheques sem fundos, obstaculizando a obtenção de crédito na praça.

O direito à indenização por dano moral é assegurado pela CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988 - art. 5º, inciso X - bem como pelo art. 186, do Código Civil Brasileiro.

Além disso, "indenizar significa reparar o dano causado à vítima, integralmente. Se possível, restaurando o 'statu quo ante', isto é, devolvendo-a ao estado em que se encontrava antes da ocorrência do ato ilícito." (STOCO, Rui, Responsabilidade civil e sua interpretação jurisprudencial: doutrina e jurisprudência. 2. ed. rev. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p. 439).

Entretanto, face à peculiaridade do caso sob julgamento, entendo pertinente invocar precioso ensinamento de WILSON CAMPOS, segundo o qual "quais os fatos que o Juiz perquire no processo e que as partes ministram-lhe sob a forma do alegado e provado? São fatos ligados a 'acontecimentos' ou sucessos humanos. Não são fatos puros. O juiz precisa 'compreender' o que se passa para bem ajuizá-lo. A sentença exprime, sempre, um juízo de valor, e resulta de uma opção feita pelo magistrado. Neste sentido ele assume o seu veredicto (a verdade que diz, com a sentença). É dentro desse campo - essencialmente valorativo - que o Juiz se movimenta. A pesquisa que ele há de fazer, quanto à prova dos fatos, por um lado, é quanto ao Direito aplicável, por outro, é uma pesquisa do Juízo que lhe cumpre expressar e assumir pela sentença. 'Aplicar' a lei, para o Juiz, não significa conferir um fato ou uma situação jurídica determinada com uma norma abstrata. É muito mais. não há o que conferir. Há o que descobrir. E o que se descobre é o próprio Juízo de valor, em que consiste a sentença. É esta a verdade judicial, expressa no veredicto do Juiz. [...] na verdade, é o Juiz que compõe a 'norma' válida para o caso concreto, esta norma que é a sentença. Antes da sentença, não existem senão 'normas', todas elas à disposição do Juiz, mas nenhuma podendo resolver o problema da sentença. E esta norma válida, que é a sentença, resulta da interpretação judicial da Lei. Nisto consiste a função criadora da jurisprudência, função que muitos Juizes exercem sem o saber, como Monsieur Jourdain escrevia prosa." (CHAGAS. Wilson. A cena judiciária. 2. ed. Porto Alegre: Revista de Jurisprudência do tribunal de Justiça, 1983. p. 20-21).

Contemplando tal entendimento, em atenção à disposição contida no art. 5º, inc. XXXV, da CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988, a Lei nº 9.099/95 preceitua, em seu art. 6º, que 'o Juiz adotará em cada caso a decisão que reputar mais justa e equânime, atendendo aos fins sociais da lei e às exigências do bem comum'.

Amolda-se, ainda, ao caso sob julgamento magnífico raciocínio professado por DARCI GUIMARÃES RIBEIRO, para quem "é natural, provável, que um homem não julgue sem constatar o juízo com as provas que lhe são demonstradas. Quando o autor traz um fato e dele quer extrair conseqüências jurídicas, é que, via de regra, o réu nega em sentido geral as afirmações do autor; isto gera uma litigiosidade, que, por conseqüência lógica, faz nascer a dúvida, a incerteza no espírito de quem é chamado a julgar. Neste afã de julgar, o juiz se assemelha a um historiador, na medida em que procura reconstituir e avaliar os fatos passados com a finalidade de obter o máximo possível de certeza, pois o destinatário direto e principal da prova é o juiz. Salienta MOACYR A. SANTOS que também as partes, indiretamente, o são, pois igualmente precisam ficar convencidas, a fim de acolherem como justa a decisão. Para o juiz sentenciar é indispensável o sentimento de verdade, de certeza, pois sua decisão necessariamente deve corresponder à verdade, ou, no mínimo, aproximar-se dela. Ocorre recordar que a prova em juízo tem por objetivo reconstruir historicamente os fatos que interessam à causa, porém há sempre uma diferença possível entre os fatos, que ocorreram efetivamente fora do processo e a reconstrução destes fatos dentro do processo. Para o juiz não bastam as afirmações dos fatos, mas impõem-se a demonstração da sua existência ou inexistência, na medida em que um afirma e outro nega, um necessariamente deve ter existido num tempo e num lugar, i.e., uma de ambas as afirmações é verdadeira. Daí dizer com toda a autoridade J. BENTHAM que "el arte del proceso no es esencialmente otra cosa que el arte de administrar las pruebas''".

Segue o mestre afirmando que "o problema da verdade, da certeza absoluta, repercute em todas as searas do direito. A prova judiciária não haveria de escapar desses malefícios oriundos dessa concepção, tanto isto é certo que para o juiz sentenciar é necessário que as partes provem a verdade dos fatos alegados, segundo se depreende do art. 332 do Código de Processo Civil" [...]. Mais adiante sintetiza que "por objeto da prova se entende, também, que é o de provocar no juiz o convencimento sobre a matéria que versa a lide, i.e., convencê-lo de que os fatos alegados são verdadeiros, não importando a controvérsia sobre o fato, pois um fato, mesmo não controvertido, pode influenciar o juiz ao decidir, na medida que o elemento subjetivo do conceito de prova (convencer) pode ser obtido, e. g., mediante um fato notório, mediante um fato incontroverso."

Destaca o jurista, ainda, que [...] "a parte não está totalmente desincumbida do ônus da prova de uma questão de direito, na medida que cada qual quer ver a sua alegação vitoriosa devendo, por conseguinte, convencer o juiz da sua verdade." E conclui destacando que "o juiz julga sobre questões de fato com base no que é aduzido pelas partes e produzido na prova." (RIBEIRO, Darci Guimarães. Tendências modernas da prova. RJ n. 218. dez-1995. p. 5).

Sobre a matéria objeto do presente feito, colhe-se do remansoso entendimento da 4ª TURMA DE RECURSOS de Santa Catarina que "pacífica está, inclusive nesta Casa, a desnecessidade da prova do prejuízo, pelos dissabores ocasionados em face de apontamento do apelado ao rol de não pagadores. Também, caracteriza os danos morais reclamados o descumprimento do art. 43, § 2º do CDC. [...] A mera inscrição indevida em bancos de dados, que é situação vexatória, é suficiente para autorizar a indenização por danos morais." (Apelação Cível nº 2.063, da Comarca de Tubarão, em que é apelante Losango Promotora de Vendas Ltda. e apelado Roni Medeiros Goulart: Relator Juiz Guilherme Nunes Born. Criciúma, 21 de agosto de 2003), e, ainda, "a simples manutenção do nome do consumidor em cadastro restritivo de crédito, quando a obrigação já está quitada, por prazo de meses, gera o dever de indenização, por ser ato que causa transtorno, perturbação a tranqüilidade da vítima". (Apelação Cível nº 1.806, de Tubarão, sendo apelantes e apelados A. ANGELONI & CIA. LTDA. e MORGANA DE SOUZA LIMA. Relator Juiz Guilherme Nunes Born).

Em recente decisão, a Segunda Câmara de Direito Civil do TRIBUNAL DE JUSTIÇA de Santa Catarina decidiu que "configura dano moral a manutenção indevida do nome do devedor junto aos bancos de dados dos órgãos controladores do crédito, quando a dívida já houver sido quitada, independentemente de comprovação do prejuízo material sofrido pela pessoa indigitada, ou da prova objetiva do abalo à sua honra e à sua reputação, porquanto são presumidas as conseqüências danosas resultantes desse fato, o valor da indenização do dano moral deve ser arbitrado pelo Juiz de maneira a servir, por um lado, de lenitivo para a dor psíquica sofrida pelo lesado, sem importar a ele enriquecimento sem causa, ou estímulo ao abalo suportado; e, por outro lado, deve desempenhar uma função pedagógica e uma séria reprimenda ao ofensor, para evitar a recidiva." (Ed. 069/03 - Apelação Cível 2000.002438-4, de Criciúma. Relator: Des. LUIZ CARLOS FREYESLEBEN. Apelante: BANCO MERCANTIL DE SÃO PAULO S/A. Apelado: JOÃO BATISTA DE SOUZA. Decisão: por votação unânime, desprover o recurso do réu. Custas de Lei. Decisão publicada no DIÁRIO DA JUSTIÇA nº 11.152, de 18.03.2003. p.08).

Dos demais Tribunais pátrios colhe-se que "restando provado nos autos a inscrição indevida do nome da parte no SPC, causando-lhe constrangimento e perda de crédito, impõe-se a indenização por danos morais, fixando-se o quantum indenizatório, com prudência e equidade. Recurso parcialmente provido." (TAMG - AC 0284105-4 - 2ª C.Cív. - Rel. Juiz Delmival Almeida Campos - Julgado em 31.08.1999).

Ao caso sob julgamento – onde o nome de SIRLEI DA SILVA MATEUS restou indevidamente inserido no cadastro de emitentes de cheques sem fundos – calha bem a lição de FABRÍCIO ZAMPROGNA MATIELO trasladada da Apelação Cível nº 49.415, da Capital, da relatoria do eminente Desembargador TRINDADE DOS SANTOS, qual seja, que "os serviços de proteção ao crédito cadastram pessoas que descumprem suas obrigações nesse particular, impossibilitando a concessão de novas oportunidades. Em assim sendo, não fica difícil imaginar o transtorno causado a alguém cujo nome foi injustamente colocado no rol dos inadimplentes, ou em relação a quem não se fez a devida retirada do nome, após a regularização da situação. Tal fato, além da inviabilização da obtenção de novos créditos, traz abalo moral, face à consulta positiva nos arquivos do serviço e a conseqüente desvalorização íntima ou objetiva da vítima' [...] A indenização por danos morais, em casos dessa natureza, vem sendo admitida com força intensa nos Tribunais nacionais, visando disciplinar o cadastramento de informações e a sua regular utilização. Em conclusão, pode-se dizer que, havendo conduta censurável e aplicação de meios que diminuam moralmente alguém, interna ou externamente, provocando danos (desvalorização, desequilíbrio psicológico, discriminação, etc.), o atingido pode valer-se do pedido judicial de responsabilização civil por danos morais e materiais" (Dano moral, dano material e reparação. Posto Alegre: Luzzatto Editores, 1995. p. 133-134).

Entendo, pois, que há indiscutível culpa do BANCO DO BRASIL por não ter efetuado – de modo cauteloso e proficiente – a constatação de crédito pecuniário suficiente à compensação do cheque de R$ 33,90 (trinta e três reais e noventa centavos), emitido por SIRLEI DA SILVA MATEUS, ocasionando a negativação de seu crédito na praça, em decorrência do lançamento de seu nome no cadastro de emitentes de cheques sem fundos.

Diante de tal situação, no concernente à prova do prejuízo, esta não se faz necessária, pois, para a obtenção do abalo de crédito puro, não se exige a comprovação do dano moral. Sendo assim, é irrelevante para o deslinde da controvérsia a comprovação do dano sofrido, bastando o registro de indevida inclusão do nome da autora no órgão de proteção ao crédito, em face da negligência e desídia do banco réu, constituindo a implementação de ato lesivo ao nome e à credibilidade de SIRLEI, sendo absolutamente possível, portanto, a busca de reparação pecuniária.

Em conferência pronunciada no "SEMINÁRIO DE ESTUDOS JURÍDICOS DE UBERLÂNDIA", o Professor HUMBERTO THEODORO JÚNIOR disse, a propósito do dano moral e das decisões que vêm sendo lançadas pelos Tribunais, que "o importante dessa moderna posição jurisprudencial está em que a fixação do problema dentro do âmbito do dano moral afasta a exigibilidade de prova, pela vítima, da repercussão do ato ofensivo sobre seu patrimônio. O condicionamento que a velha jurisprudência fazia, no sentido de ter de se demonstrar que o ultraje moral acarreta um prejuízo econômico, para só então deferir a indenização, frustrava a maioria das pretensões de responsabilidade civil em áreas como a dos protestos cambiários e outros atos igualmente lesivos à honra da vítima, mas de reflexos mate- riais problematicamente comprováveis. Agora as coisas se simplificam, pois a razão da reparação não está no patrimônio, mas na dignidade ofendida, ou na honra afrontada. É o dano moral, em toda sua intei- reza, que encontra uma sanção na lei" (Revista da Amagis, p. 443).

Como restou insofismavelmente demonstrado, não há que se cogitar a necessidade da autora provar o abalo moral sofrido para se ver indenizada, face à indiscutível culpa do banco réu.

Quanto à fixação do 'quantum debeatur', trata-se de incumbência do magistrado, que deve fundamentar seu arbitramento na eqüidade e em diretrizes estabelecidas pela doutrina e jurisprudência.

Ensina o saudoso PONTES DE MIRANDA que "embora o dano moral seja um sentimento de pesar íntimo da pessoa ofendida, para o qual não se encontra estimação perfeitamente adequada, não é isso razão para que se lhe recuse em absoluto uma compensação qualquer. Essa será estabelecida, como e quando possível, por meio de uma soma, que não importando uma exata reparação, todavia representa a única salvação cabível nos limites das forças humanas. O dinheiro não os extinguirá de todo: não os atenuará mesmo por sua própria natureza, mas pelas vantagens que o seu valor permutativo poderá proporcionar, compensando, indireta- mente e parcialmente embora, o suplício moral que os vitimados experimentaram". (RTJ 57/789-90).

Complementa WILSON BUSSADA avultando que "realmente, na reparação do dano moral o juiz deverá apelar para o que lhe parecer eqüitativo ou justo, mas ele agirá sempre com um prudente arbítrio, ouvindo as razões da parte, verificando os elementos probatórios, fixando moderadamente uma indenização. Portanto, ao fixar o `quantum´ da indenização, o juiz não procederá a seu bel-prazer, mas como um homem de responsabilidade, examinando as circunstâncias de cada caso, decidindo com fundamento e moderação. Arbítrio prudente e moderado, assevera ARTUR OSCAR DE OLIVEIRA DEDA, não é mesmo que arbitrariedade. Além, disso, sua decisão será examinada pelas instâncias superiores e esse arbítrio está autorizado por lei (arts. 1549 e 1533, do Código Civil), sendo até mesmo concedido ao juiz, em muitos casos, inclusive nos de danos patrimoniais. Assim sendo, não há que se falar em excessivo poder concedido ao juiz". (Danos e interpretações pelos tribunais.).

São critérios de fixação do 'quantum' estabelecidos por WLADIMIR VALLER: "a) a importância da lesão, ou da dor sofrida, assim como sua duração e seqüelas que causam a dor; b) a idade e o sexo da vítima; c) ao caráter permanente ou não do menoscabo que ocasionará o sofrimento; d) a relação de parentesco com a vítima quando se tratar do chamado dano por ricochete; e) a situação econômica das partes; f) a intensidade de dolo ou ao grau da culpa". (A reparação do dano moral no direito brasileiro. São Paulo: EV. 1994, p. 301).

Assim, atentando para tudo o que dos autos consta – especialmente o fato de que o BANCO DO BRASIL encontra-se sujeito às vicissitudes administrativas contemporâneas – observados, ainda, os critérios supramencionados de fixação do 'quantum debeatur', e a pequena repercussão implementada na personalidade de SIRLEI DA SILVA MATEUS, atentando para os demais pré-requisitos – tanto de ordem objetiva quanto subjetiva que levo em consideração – tenho por bem arbitrar a indenização, à míngua de critérios legais particulares, no valor equivalente a 50 (cinqüenta) vezes o valor do cheque constante à fl. 13, quantia esta que servirá de lenitivo ao abalo sofrido pela autora, mas que impede alcance a culminância do enriquecimento indevido.

De destacar, ainda, que na fixação do dano moral não se poderá esquecer a advertência do Des. DÉCIO ANTÔNIO ERPEN, para quem "a indenização a título de dano moral inegavelmente há que se dar numa faixa dita tolerável. Se o dano causado, injustamente a outrem, integra uma faixa de ruptura das relações sadias, a reparação do mesmo não pode servir de motivo para se gerar mais uma espécie de desagregação social" (RT 758/51).

Por fim, entendo importante destacar recente julgado da 4ª TURMA DE RECURSOS de Santa Catarina, de onde, acerca da quantificação da indenização por dano moral, colhe-se que "a questão dos danos morais, quanto ao seu arbitramento, tem levado a muitas discussões jurídicas. Na verdade, as circunstâncias na espécie são normais, levando em conta que o ora apelante não honrou com dois cheques dado ao apelado, que de modo equivocado emitiu as duplicatas protestadas. Então, adotando-se a orientação que serve os danos morais como uma repreensão ao ofensor e uma satisfação à vítima, fixa-se em R$ 2.000,00, o valor [...]. Neste norte, a orientação do E. Superior Tribunal de Justiça: "... O arbitramento, como assinalado em diversas oportunidades, deve operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa, à gravidade da lesão e deve servir também como medida educativa, obedecendo sempre aos princípios da proporcionalidade e razoabilidade..." e, "...A indenização por danos morais deve ser fixada em termos razoáveis, não se justificando que a reparação venha a constituir-se em enriquecimento sem causa, com manifestos abusos e exageros, devendo o arbitramento operar-se com moderação, proporcionalmente ao grau de culpa e ao porte econômico das partes, orientando-se o Juiz pelos critérios sugeridos pela doutrina e pela jurisprudência, com razoabilidade, valendo-se de sua experiência e do bom senso, atento à realidade da vida e às peculiaridades de cada caso. Ademais, deve ela contribuir para desestimular o ofensor a repetir o ato, inibindo sua conduta antijurídica..." Evidente o transtorno ocasionado pela apelada ao apelante, com protesto de título emitidos de modo irregular, mas também, não se pode olvidar a participação do apelante quando do momento da fixação do valor indenizatório a título de danos morais." (Apelação Cível nº 2.174, da comarca de Tubarão. Apelante: ALCIDES MARTINS DE SOUZA. Apelada: CERÂMICA MACCARI LTDA. Relator Juiz Guilherme Nunes Born. Julgado em 16.10.2003).

Deste modo, porquanto face aos fundamentos elencados, especialmente observando as regras de proteção às relações de consumo, e, ainda, a disposição inserida no art. 6º, da Lei nº 9.099/95, a procedência do pedido é medida que se impõe, restringida, apenas, a quantificação do valor pleiteado.

POSTO ISTO, considerando, ainda, o mais que dos autos consta – especialmente os princípios gerais de Direito aplicáveis à espécie – com arrimo em o disposto no art. 5º, 'caput' e inc. X, da CONSTITUIÇÃO FEDERAL de 1988, c/c. art. 186, do CÓDIGO CIVIL, julgo parcialmente procedente o pedido, tornando definitivo o efeito da antecipação de tutela concedida às fls. 21/22, condenando o BANCO DO BRASIL S/A. a pagar a ... – à título de indenização por dano moral – o valor de R$ 1.695,00 (hum mil, seiscentos e noventa e cinco reais), equivalente a 50 (cinqüenta) vezes o valor do cheque constante à fl. 13, monetariamente corrigido à contar desta decisão, devidamente acrescido de juros legais a contar da citação (02.09.2004 - fl. 28), cabendo ao ESCRIVÃO JUDICIAL formalizar o elenco de diligências pertinentes, com as cautelas de praxe. Incabível a condenação nas custas e honorários advocatícios (art. 55, 'caput', da Lei nº 9.099/95).

Publique-se. Registre-se. Intimem-se.

Tubarão, sexta-feira, 23 de setembro de 2005.

L. F. Boller
JUIZ DE DIREITO

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Não há dano moral quando paciente não segue orientações médicas

A família ingressou com a ação contra a entidade médica requerendo a reparação dos danos materiais e morais gerados pelo nascimento do co-autor, um ano após a realização de vasectomia no pai. O pedido foi negado em primeira e segunda instância.

Liberação fraudulenta de FGTS gera indenização a cliente

Cliente de casa bancária que teve o FGTS sacado de maneira fraudulenta tem direito à reposição dos valores e indenização por dano moral, conforme decisão do Tribunal de Justiça.

Cliente receberá reparação por queda em supermercado

Cliente que teve queda em esteira rolante de supermercado deve ter reparação material e moral, conforme decisão do Tribunal de Justiça, que majorou indenização estabelecida em primeira instância.

Concedida alteração de regime de bens na vigência do Código Civil de 1916

Casal interpõem pedido de autorização judicial para alteração do regime de bens do casamento, qual seja, da separação total de bens. Julgado improcedente o pedido, foi interposta apelação ao Tribunal, que deu provimento ao recurso.

E-mail depreciativo gera indenização por dano moral

A elaboração e divulgação de mensagem eletrônica (e-mail) depreciativa à imagem de determinada empresa configura ato ilícito. Entendimento do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul que manteve a condenação por danos morais em 50 salários mínimos.

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