Doença relacionada ao tabagismo confere indenização a fumante

Julgados - Direito Civil - Quarta-feira, 21 de setembro de 2005

A indústria Souza Cruz deve indenizar fumante, que contraiu Tromboangeíte Obliterante (Doença de Buerguer), relacionada diretamente ao tabagismo. Com a evolução da moléstia, ele sofreu a amputação de três dedos do pé esquerdo e também desenvolveu quadro depressivo (confira o caso abaixo). A 9ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul confirmou a condenação, por unanimidade, e fixou o valor indenizatório em R$ 350 mil, acrescidos de juros a contar da data do fato.

A relatora do processo, Desembargadora Marilene Bonzanini Bernardi, salientou que para que se reconheça o dever de indenizar é necessário examinar a presença do dano, culpa e nexo causal. No caso, asseverou, trata-se de uma relação de consumo e a responsabilização se dá independentemente da existência de culpa, como preceitua o Código de Defesa do Consumidor.

Conforme o CDC, ressaltou, “a responsabilidade do fornecedor é objetiva, decorrente dos riscos criados pela colocação de seu produto no mercado de consumo, cuja onerosidade gerada não deve ser compartilhada ou suportada pelo consumidor, pessoa que, em tese, desconhece os métodos e os mecanismos de produção”.

Na avaliação da magistrada, o livre arbítrio para fumar também não serve para afastar o dever de indenizar das companhias fumageiras pelas mesmas razões que não se presta para justificar a descriminalização das drogas. “O homem precisa ser protegido de si mesmo, mormente porque lidamos com produtos que podem minar a capacidade de autodeterminação”.

Ponderou que, mesmo sendo obrigatórias as propagandas de advertência dos malefícios do fumo para a comercialização de cigarros, a publicidade do produto sempre foi vinculada às idéias, ainda que contraditórias, de saúde, intelectualidade, cultura, beleza, charme e sedução. “Atributos que todo jovem busca a qualquer custo, o que sempre deu larga margem de vantagem para indústria fumageira que capta seus clientes exatamente na fase da juventude, quando se tomam posturas de auto-afirmação e se busca a formação de uma identidade”. Lembrou que autor da ação começou a fumar em 1988, mesmo ano em que as advertências de risco à saúde passaram a ser veiculadas. Contudo, frisou, “a publicidade enganosa já tinha surtido os efeitos pretendidos”.

Votos favoráveis
A responsabilização civil motivada pelo risco inerente ao produto já é uma tendência internacional e nacional, demonstrou o Desembargador Odone Sanguiné. No Brasil, disse, o posicionamento encontra amparo no CDC, Constituição Federal e também no Código Civil de 2002. Segundo ele, ainda, o livre arbítrio não pode ser comprovado num processo penal. Ressalvou, por outro lado, que nem todos os casos envolvendo indústria fumageira serão procedentes. “É preciso avaliar caso a caso.”

O mesmo posicionamento foi compartilhado pelo Juiz-Convocado ao TJ Miguel Ângelo da Silva. Segundo ele, a responsabilidade do fabricante resulta do risco de produzir e comercializar produto potencialmente danoso à saúde. Quanto ao livre arbítrio para consumir o cigarro, entende que a questão precisa ser avaliada com flexibilidade. “O uso, a dependência química vai minando a vontade do fumante.”

Caso
Ao propor a ação de indenizaçã por danos morais, que teve sentença favorável junto à 3ª Vara Cível da Capital (Proc. 10500811320), o fumante revelou ser consumidor, há 13 anos, de cigarro da marca “Carlton”, produzido pela indústria-ré. Relatou que em 1999 sentiu fortes dores na perna esquerda e o diagnóstico apontou a doença. Continuou a fumar e o quadro clínico piorou, resultando na amputação. Salientou os efeitos nocivos gerados pelo tabagismo e a dependência física e psicológica causada pela nicotina, uma das substâncias do cigarro.

O recurso foi interposto pela empresa, ressaltando que antes de 1988, ano em que o autor teria iniciado o consumo do produto, inexistia a exigência de divulgação de cláusulas de advertência de consumo. Razão pela qual não pode ser acusada de omissão de informações. Destacou também que tanto a decisão de começar quanto a de parar de fumar são frutos do livre arbítrio das pessoas, não existindo no cigarro qualquer substância capaz de influir na tomada de decisão. Os riscos para saúde associados ao consumo e tabaco, afirmou, são conhecidos pelo público em geral e veiculados pelos meios de comunicação, há muito tempo.

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